Emory Douglas: A Arte Radical de Um Pantera Negra

We Are Soldiers... (“Nós Somos Soldados…”). Poster; aprox. 1969. A página do Oakland Museum of California descreve a obra: “O canto inferior esquerdo do cartaz apresenta o seguinte texto: Somos soldados / no exército / Temos que lutar / embora tenhamos de morrer / Nós temos que segurar a bandeira / manchada de sangue / Nós temos que segurá-la / até morrer / Minha mãe era um soldado / ela tinha em sua mão o arado da liberdade / e quando ela ficou velha e não podia mais lutar / ela disse que lutaria de qualquer maneira / Meu pai foi um soldado / ele tinha em sua mão o arado da liberdade / e quando ele ficou velho e não podia mais lutar / ele disse que lutaria de qualquer forma / Agora todos nós somos soldados / Nós temos em nossas mãos o arado da liberdade / e quando ficarmos velhos e não possamos mais lutar / Nós teremos que nos levantar e lutar de qualquer maneira”. (Imagem: Reprodução/Internet).

Emory Douglas foi um dos responsáveis pela criação da iconografia do Movimento Black Panther. Além de Ministro da Cultura daquele movimento social negro-estadunidense, Emory também criou as ilustrações para o jornal do grupo assim como dúzias de posteres de imagens bem fortes. Seu conjunto de obras pode ser classificado como uma arte radical, e ainda hoje, altamente relevante.

Em um momento de fortes mudanças sociais e culturais, e de intensa turbulência para a população negra dos Estados Unidos, o artista Emory Douglas começou a produzir uma arte explicitamente política, ou mais especificamente, uma arte político-racial.

All power to the people (“Todo poder para o povo”). Ilustração; 9 de março de 1969. “Todo poder para o povo” foi um slogan frequentemente usado pelo partido (The Guardian). (Imagem: Reprodução/Internet).

Carregadas de forte conteúdo social, suas obras nasceram dentro de um grupo, ou movimento político radical, que provocou as mais variadas reações nos Estados Unidos devido a sua estratégia de mobilização armada.

Emory Douglas foi parte integral do movimento Pantera Negra desde que assumiu o ministério da cultura em 1967 e produziu ilustrações para o jornal Black Panther Black Community News Service (Black Panther Serviço de Notícias Para a Comunidade Negra), as quais se tornariam poderosos símbolos daquele movimento. O jornal chegou a ter centenas de milhares de leitores em todo os Estados Unidos, incluindo aqueles que o viam como uma ameaça (AIGA). Mesmo que tenha sido desfeito nos anos 1980, o legado do Pantera Negra continua, assim como o trabalho de Emory Douglas.


Hallelujah! The Might and the Power of the People is Beginning to Show (“Aleluia! O Poder do Povo Está Começando a Aparecer”). Poster, jornal do Pantera Negra; 25 de julho de 1970. (Imagem: Reprodução/Internet).

We Want an end to the robbery by the Capitalist of our Black Community (“Queremos um fim ao roubo da nossa Comunidade Negra pelo capitalista”). Poster; sem data. A ilustração mostra um porco-papai noel entrando em uma casa pela chaminé e sendo aguardado por três crianças armadas. Em outubro de 1966, o partido Black Panther apresentou seus dez objetivos da sua plataforma & programa What we want–What we believe (O que queremos – O que acreditamos). O objetivo número 3 dizia: “Queremos um fim ao roubo da nossa Comunidade Negra pelo capitalista. Acreditamos que este governo racista nos roubou e agora estamos exigindo a dívida vencida de quarenta acres e duas mulas. Quarenta acres e duas mulas foram prometidos 100 anos atrás como restituição pelo trabalho escravo e assassinato em massa do povo negro. Nós aceitaremos o pagamento em moeda, que serão distribuídos, para as nossas muitas comunidades. Os alemães estão agora ajudando os judeus em Israel pelo genocídio do povo judeu. Os alemães assassinaram seis milhões de judeus. O racista americano tomou parte no massacre de mais de cinquenta milhões de pessoas negras; portanto, sentimos que esta é uma demanda modesta que nós fazemos”. (Blog do Denver Museum of Contemporary Art) (Imagem: Reprodução/Internet).

Demorou muito para que o conjunto de obras de Emory Douglas fosse ‘oficializado’—tecnicamente falando—como “arte”, pois “só a partir dos anos 2000 as obras de Emory Douglas tornaram-se objeto de curadoria para exposições retrospectivas” (Dangerous Minds), e foi somente em 2007 que suas obras foram reunidas em um livro, Black Panther: The Revolutionary Art of Emory Douglas, que em 2014 ganhou uma nova edição capa-dura e reformatada.

Revolution In Our Lifetime (“Revolução Durante Nosso Tempo de Vida”). Poster; 1970. A página do Oakland Museum of California descreve a obra como sendo um desenho estilizado de um homem e uma mulher com armas, e que “a figura do mais proeminente, usa uma camisa branca, com um botão ou uma figura remendada que contém a fotografia de uma criança”. Esta obra foi usada na capa do livro, Black Panther: The Revolutionary Art of Emory Douglas. (Imagem: Reprodução/Internet).

“Douglas originalmente ajudou na composição do jornal do Pantera Negra, e percebeu que a arte poderia realçar a campanha do movimento e alcançar as massas”. (The Guardian).

Hey, Mister, What you are doing to the poor man, Lord knows, You Oughta Quit It (“Ei, Senhor, O Que Você Está Fazendo ao Homem Pobre, Deus está sabendo, Você Tem Que Parar Com Isso”). Poster, jornal do Pantera Negra; 6 de maio de 1972. (Imagem: Reprodução/Internet).

Em 13 de novembro de 2014, o site Dangerous Minds publicou um artigo muito bom sobre o artista. Leia abaixo nossa tradução do artigo:


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Pantera Negra: A Arte Revolucionária de Emory Douglas

Um dos aspectos originais dos Panteras Negras enquanto um projeto político, foi a sua ênfase no componente cultural do trabalho revolucionário. Além da educação de base em comunidades negras e dos programas sociais para crianças e adultos, os Panteras Negras tinham seu próprio grupo musical (O Lumpen), e um Ministro da Cultura, o inovador Emory Douglas, cuja arte para o jornal O Pantera Negra criou um contexto visual para a libertação dos negros. A arte política de Douglas era honesta. Sua própria infância pobre na área da baía de São Francisco foi interrompida por um período passado em um centro de detenção juvenil, onde encontrou um nicho na gráfica da prisão. Mais tarde ele estudou arte comercial na Universidade da Cidade de São Francisco onde se filiou à Associação de Estudantes Negros antes de ser nomeado Ministro da Cultura do grupo Pantera Negra.

O trabalho de Douglas é incrivelmente diferente, muitas vezes produzidos com um orçamento muito baixo e em muito pouco tempo. Ele favoreceu as linhas audaciosas, orgânicas, um trabalho de colagem cuidadoso, e as cores saturadas, criando tanto imagens dignificantes do povo negro quanto caricaturas dos antagonistas políticos (muitas vezes soldados, policiais ou políticos retratados como ratos e porcos). Você vai notar uma grande quantidade de armas—mas lembre-se de que o nome original do grupo era ‘The Black Panther Party for Self-Defense’ (Partido Pantera Negra Para Auto Defesa), e que grande parte da intenção original era proteger as comunidades negras do assédio da polícia, mas Douglas também investiu na produção de imagens de esperança jubilosas ou virtuosas. Douglas encontrou com sucesso um equilíbrio perfeito entre otimismo e realismo, uma negociação que produziu um enorme e variado conjunto de obras que ainda carrega o seu estilo inconfundível.

Embora Douglas tenha continuado a produzir sua arte bem após a dissolução do Black Panther (mais notavelmente para o jornal orientado à comunidade negra, The San Francisco Sun Reporter) as obras apresentadas aqui foram produzidas durante sua gestão como Ministro da Cultura (entre 1967 e 1980, muito embora as datas das obras estejam muitas vezes indisponíveis ou sejam muitas vezes contestadas).

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Assim como o Site Dangerous Minds observa em seu texto, o c&p aqui também apresenta as obras produzidas por Emory Douglas durante seu período no Pantera Negra. Visite a página de Emory Douglas clicando aqui e veja mais trabalhos do artista.

“Aos olhos de Douglas, uma mãe solteira pobre em uma favela seria heroína o suficiente para carregar uma arma e proteger sua casa e seus filhos”. (All Other Persons)

Afro-American solidarity with the oppressed people of the world (“Solidariedade dos Afro-Americanos com os povos oprimidos do mundo”). Poster; 1969. Segundo o jornal inglês The Guardian, “o Pantera Negra promovia a igualdade de gênero, e muitas mulheres pertenciam ao quadro de membros do movimento”. Porém, além da promoção de igualdade entre homens e mulheres, o movimento também promovia um movimento de solidariedade com outras populações que experimentavam regimes de opressão fora dos EUA. (Imagem: Reprodução/Internet).

The Lumpen (“Lúmpen”, que significa Farrapo; abreviação do termo alemão que faz referência aos que pertencem a massa proletária, lumpemproletariado). A página do Oakland Museum of California descreve a obra: “A borda superior do poster contém o texto: The Heir Of Malcolm Have Picked Up The Gun / And Now Stand Millions Strong Facing The Racist Pig Oppressor (‘O herdeiro de Malcolm já pegou a arma / E Agora Milhões se Levantam A Enfrentar Fortemente o Racista Porco Opressor’). Abaixo do cartaz tem um grande desenho estilizado de uma figura masculina e uma figura feminina. Mostradas da cintura para cima, as duas figuras estão localizadas no lado direito do cartaz com a figura feminina um pouco à frente da figura masculina. A mulher está vestindo uma roupa laranja e um botão com o texto: Free All Political Prisoners (‘Libertem Todos os Prisoneiros Políticos’), ela está segurando um rifle com uma baioneta. A homem segura uma arma que está com a ponta parcialmente cortada pela borda esquerda do poster, ele usa um botão com o texto: All Power To The People (‘Todo o Poder Ao Povo’). A borda inferior apresenta o texto: The Lumpen (‘O Lúmpen’) com um pequeno logotipo Black Panther no centro. Como observado anteriormente, ‘lúmpen’ é uma abreviação da palavra ‘lumpemproletariado’, um termo originalmente utilizado por Karl Marx para descrever as classes mais empobrecidas que não conquistam a consciência de classe, mas o termo mais tarde veio a incluir todas as classes mais baixas. Neste caso, o termo foi apropriado pelo movimento Pantera Negra como uma auto-definição de orgulho e de autenticidade”. (Imagem: Reprodução/Internet).

All The Weapons We Used To Use Against Each Other We Now Use Against The Opressor (“Todas As Armas Que Costumávamos Usar Um Contra o Outro Agora Usamos Contra o Opressor”). Poster; Aprox. 1970. (Imagem: Reprodução/Internet).

Black Panther. O grupo radical, partido, ou movimento social, Pantera Negra, foi formado na Califórnia em 1966. Inicialmente o grupo nasceu para proteger as comunidades locais contra o racismo e a brutalidade policial. Surgindo no ano seguinte à morte de Malcolm X, o Black Panther seguia os princípios teóricos socialistas daquele líder negro: a união da classe trabalhadora internacional superando as linhas de cor e gênero, bem como a união dos vários grupos revolucionários, tanto brancos quanto de minorias.

We Shall Survive Without a Doubt (“Devemos Sobreviver Sem Nenhuma Dúvida”). Poster, jornal do Pantera Negra; 21 de agosto de 1971. (Imagem: Reprodução/Internet).

Fornecendo educação de base, clínicas de medicina básica, e comida, o Pantera Negra chegou a alimentar 10 mil crianças diariamente antes da escola. Com uma participação curta mas importante no movimento de direitos civis, o grupo acreditava que a campanha de não-violência de Martin Luther King Jr. havia fracassado e que verdadeiras mudanças nas vidas dos negros não viriam através das vias tradicionais do movimento de direitos civis.

Sem Título. Ilustração; 20 de dezembro de 1967. A Emery Douglas é dado o crédito de ter popularizado o termo “pig” (porco) como referência a policiais corruptos (The Guardian). O texto da ilustração diz: “O quê é um porco? Um animal de natureza baixa que não tem respeito pela lei, justiça, ou pelos direitos das pessoas; uma criatura que morde a mão que o alimenta; um imundo, caluniador depravado, encontrado comumente disfarçado de vítima de um ataque não provocado”. (Imagem: Reprodução/Internet).

Os fundadores do Black Panther, Huey Percy Newton e Bobby Seale, pregavam uma “guerra revolucionária” mas se consideravam um partido negro-estadunidense disposto a manifestar-se em nome de todas minorias oprimidas. O grupo tinha quatro desejos: igualdade em educação, moradia, emprego, e garantia de direitos civis, e foi também um forte oponente à guerra do Vietnã. Sobrevivendo até os meados dos anos 1980, o Pantera Negra foi desfeito após uma bem longa campanha (argumentada por muitos como difamatória) articulada pelo FBI, cujo diretor Edgar Hoover chegou a declarar que o grupo era “a maior ameaça à segurança interna do país”.

Sem Titulo. Capa do Jornal Black Panther Black Community News Service Poster; 1969.O cartaz acima do capacete do soldado diz Our Fight Is Not In Vietnam (“Nossa Luta Não É No Vietnã”), e um texto em negrito à esquerda do cartaz diz, Free the GIs (“Libertem Nossos Soldados”). (Reprodução/Internet).

Sem Título. Poster; 21 de setembro de 1974. “O trabalho ilustra como os interesses das grandes corporações controlavam o presidente” (The Guardian). O presidente retratado na colagem é o republicano Gerald Ford, 38o presidente dos EUA, que assumiu o cargo após a renúncia de Richard Nixon em 1974. Na ilustração, o balão de fala diz, “I Gerald Ford as the 38th Puppet of the United States” (“Eu, Gerald Ford, como o 38o fantoche dos Estados Unidos”). (Imagem: Reprodução/Internet; AIGA.

I’ve Lived Through Some Hard Times Here in ‘The Land of Plenty’, With The U.S Government Talking About a Sale For This And A Charge For That, While We The People Starve! (“Eu Passei Por Uns Maus Momentos Aqui na ‘Terra da Prosperidade’, Com o Governo dos EUA Falando Sobre Uma Liquidação Pra Isso e Uma Taxa Pra Aquilo, Enquanto Nós O Povo Passamos Fome!”). Poster; 22 de julho de 1972. (Reprodução/Internet).

Freedom Is a Constant Struggle (“A Liberdade É uma Luta Constante”). Poster; 1971. A página do Oakland Museum of California descreve a obra: “O poster apresenta um desenho estilizado de um idoso sentado em uma cadeira com um bebê no colo. O homem está vestindo uma calça azul, uma jaqueta azul, uma camisa verde, sapatos verdes e um chapéu marrom; ele está sentado sobre um cobertor roxo em uma cadeira também roxa. O homem parece estar falando com a criança, seus olhos estão fechados e ele está apertando seu punho esquerdo. O bebê está vestindo uma roupa verde, e assim como o homem mais velho, os seus olhos e seu punho esquerdo também estão fechados”. (Reprodução/Internet).

“Ah, as memórias. Houve um tempo em que ‘Power to the People’ não era apenas algo que as pessoas diziam, mas algo que as pessoas sentiam nos corações. Emory colocou esse sentimento no papel, em imagens ousadas e poderosas. Ele deu às pessoas um novo espelho para verem a si mesmos e o mundo. Como Cornell West diz, ‘sua arte viverá para sempre’. (All Other Persons)

2 comentários:

  1. Babaca oportunista, que nunca enxergou um palmo diante do nariz...

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